Minha
relação umbilical com a Universidade
Aproveito
esse momento, em que estou em campanha para o mais lato cargo dentro da unidade
universitária a que pertenço, na universidade pública federal brasileira, para
fazer esse balanço de minha relação com tal universidade, e me vejo ligado a
ela desde minha gestação, e mesmo antes, na medida em que meus pais começaram a
namorar quando colegas de faculdade, de direito, na hoje centenária, desde
2004, Faculdade de Direito da cinquentenária Universidade Federal do Ceará. No
centenário da Faculdade, a diretora, primeira mulher de sua história, era minha
Mãe, falecida no ano seguinte, Maria Magnólia Lima Guerra, e quando da fundação
da Universidade, conforme registra em sua Autobiografia o então diretor da Faculdade
de Direito, Antonio Martins Filho, foi de fundamental importância o apoio da
maior liderança estudantil do estado naquele momento, o Presidente da União
Estadual dos Estudantes, Willis Santiago Guerra, cujo falecimento completará
quinze anos na semana que vem. Inesquecível, quando de minha formatura em Direito,
em princípio de 1983, com atraso, devido à greve havida no meu último ano de
faculdade, meus pais presentes, também embecados, por serem professores da
Faculdade, quando surpreendo minha Mãe passando a Mãe no rosto. Eu tive de
confirmar se eram lágrimas, pois penso nunca a ter visto chorando antes, e
quando ela confirmou que sim, eu perguntei meio assustado o motivo, se ela não
estava alegre, e ela e respondeu que estava muito emocionada, pois afinal era a
segunda vez que eu me formava, o que me deixou ainda mais intrigado,
perguntando quando tinha sido a primeira que eu não sabia, e ela responde: “no
meu ventre, quando eu me formei, no nono mês da sua gravidez, em dezembro de
1961”.
De
minha Mãe, primeira colocada no vestibular e primeira aluna de sua turma, a primeira
que o Prof. Em., Dr. h.c. Dr. Paulo Bonavides lecionou após
conquistar a cátedra de Teoria do Estado com a tese, obra hoje clássica, “Do
Estado liberal ao Estado social”, sendo que dele diversas vezes ouvi comentar
ter sido ela a aluna mais brilhante que teve em toda sua docência – só a
chamava de Doutora, recebendo dela e de todos nós o tratamento correlato,
claro, apesar de todas a amizade que nos unia e une ainda, pois a ele, por
exemplo, quando estudantes, diversas vezes fui levado por meus pais para esclarecer
dúvidas que eles próprios tinham -, dela não se duvidava que seria professora
da Faculdade, mas a opção inicial foi pela criação dos filhos, pois a mim logo
se seguiu Marcelo, hoje professor da Faculdade de Direito da UFC (houve um
breve momento em que fomos os quatro, simultaneamente, professores, e meu Pai
fez questão de fazer algo que normalmente não o interessava, uma foto, dos quatro
embecados para a posse como reitor de um seu “pupilo” na política
universitária). Meu Pai seria, ou melhor, continuaria a carreira política, que
na época normalmente o levaria a ser, de plano deputado – lembro dele relatando
se a dúvida era se seria candidato primeiro a deputado estadual ou seja se
lançava logo para deputado federal, considerando sua passagem pela
secretaria-geral da UNE -, mas aí veio o golpe de 1964, com minha mãe grávida
do segundo filho, e a opção dele foi por se retirar da vida pública,
dedicando-se, com o apoio dela, em casa, à advocacia. Foi quando veio o convite
do ainda Reitor Martins Filho para que ele fosse o chefe da divisão estudantil,
seguido pelo concurso para lecionar prática forense na Faculdade de Direito, e
depois, com a transformação da divisão em Pró-Reitoria, ele veio a se tornar o
mais jovem Pró-Reitor do Brasil com amplas chances de depois se tornar o mais
jovem Reitor, quando então veio o veto do Ministro da Educação, o Coronel Jarbas
Passarinho, para que ele continuasse no cargo, considerando o seu passado de líder
estudantil e também a recusa em colaborar com o regime, quando entrevistado
pelo representante na Universidade do Serviço Nacional de Informação (SNI) –
todas tinha o seu, assim com em toda sala havia um estudante escalado para
espionar os colegas e professores, até em minha época ainda, quando eles já bem
se preocupavam mais em esconder isso. Inicia-se, então, o período negro do
ostracismo, atravessado com a dedicação à advocacia e à política universitária,
mas na “clandestinidade” – lembro ainda de uma certo dia, em que como de
costume eu ficava por perto da conversa dos adultos, de vez em quando ouvindo
deles que não poderia dizer para ninguém o que eles estavam dizendo, o que eu mal
entendia o que era, mas naquela dia eu ouvi tanto uma palavra que também mal
compreendia, que a sentia como martelando dentro de meu cérebro: “universidade,
universidade, universidade, universidade, universidade, universidade...”
Bom,
quando da fundação do curso de direito em uma universidade privada, em
Fortaleza, a Universidade de Fortaleza, recebendo o convite para lá lecionar,
minha Mãe decidiu que era hora de seguir sua vocação, apesar da gravidez do “temporão”,
José Lúcio. Nessa época ela já estava inscrita no igualmente recém-fundado
Curso de Mestrado em Direito, em parceria com as Universidades da Bahia e
Pernambuco, além do apoio de convênios internacionais e da Universidade de São
Paulo – eu, mantendo o hábito de ficar por perto dos adultos, e por conta das
leituras que já vinha fazendo, sobretudo de filosofia e sociologia, costumava
acompanhá-la nas aulas, apesar de sequer ter ainda ingressado na faculdade, e
para surpresa de professores como Tercio Sampaio Ferraz Jr., era em quem eles
encontravam uma interlocução que faltava com muito dos, digamos, regulamente
inscritos. Foi a primeira a concluir o curso, dentre os alunos dos três
mestrados, com uma tese – sim, naquela época as dissertações de mestrado era
chamadas de teses, e costumavam ser mesmo, se comparadas com as atuais, de
doutorado – praticamente fundadora da matéria do direito urbanístico entre nós,
contendo propostas que em grande parte foram contempladas décadas depois pelo
Estatuto da Cidades, mas alguns ainda estão esperando a “ousadia” do nosso legislador.
A expectativa dela era qualificar-se para suceder meu Pai na disciplina de
legislação que ele lecionava desde a fundação da Escola de Arquitetura da UFC,
tendo para tanto se apresentado, à época, com a obra “Noções de Direito de Construir”,
posto que ainda não havia a exigência dos então inexistentes cursos de
mestrado. A expectativa foi confirmada, mas antes obtivera, com a obra “Temas
de Teoria do Direito”, a cadeira de Introdução ao Estudo do Direito, na própria
Faculdade de Direito, e com a defesa da tese passou a integrar os quadros do
Curso de Mestrado em Direito, que depois veio a coordenar por diversas vezes,
seguidas e alternadas.
Meu ingresso no sistema federal de ensino superior, como docente,
se dá no ano de 1984, na então ainda recente Universidade de Fortaleza
(UNIFOR). Obtive o bacharelado em direito dois anos antes, na UFC, onde fui
bolsista do então recente programa do CNPq, de iniciação científica, o PIBIC,
bem com monitor em diversas disciplinas. Já o mestrado, também em direito, obtive
na PUC-SP no princípio de 1986, fazendo em seguida o concurso para Professor
Assistente, na Faculdade em que me formei, tendo já publicado, em 1985, pela Imprensa
Oficial do Ceará, meu primeiro livro, “Estudos Jurídicos (Teoria do Dirieto –
Direito Civil). No segundo semestre fui para o doutorado na Universidade de
Frankfurt am Main, posteriormente transferida para a Universidade de Bielefeld,
o que me deu a oportunidade de conviver com as duas escolas mais notórias do
pensamento alemão contemporâneo, a saber, aquelas encabeçadas por Jürgen
Habermas e Niklas Luhmann, respectivamente, sendo com este último que
desenvolvi uma relação de verdadeira amizade, mais (e melhor) do que a
de discípulo. Ao rerotnsr ao Brasil, publicarei, pela Universidade Federal
do Ceará, “Ensaios de Teoria Constitucional” (1989) e “Conceitos de Filosofia”
(1996), seguido de “Autopoiese do Direito “ e Introdução à Filosofia e
Epistemologia Jurídica”, no Rio Grande do Sul”. As publicações em periódicos,
nacionais e estrangeiros, foi o que mais fiz na época inicial de minha docência.
O
desenvolvimento das pesquisas me levou a obter no ano de 1996 a Livre Docência em
Filosofia do Direito, Dois anos após, obtive por concurso a titularidade em Direito
Processual Constitucional , cadeira criada pioneiramente,
entre nós, na UFC, cuja tese, publicada pelo Instituto Brasileiro de Direito Constitucional
(IBDC) com o título “Processo Constitucional e Direitos Fundamentais”,
encontra-se em sexta edição, com diversas reimpressões, agora pela editora SRS,
de São Paulo. O mesmo IBDC, sob os auspícios do Professor Celso Bastos e sua editora,
publicou também parte da tese de Livre Docência, incluindo os a maior parte dos
“Ensaios de Teoria Constitucional”, sob o título de “Teoria Processual da
Constituição”, no ano de 2000, já em terceira edição, também pela editora SRS. Ainda na época em que era professor em Fortaleza tive bolsa
de pesquisa do CNPq, órgão do qual era consultor, assim como participei da
representação da área na CAPES e fui avaliador do MEC dos cursos de direito. Na
UFC, coordenei a Especialização em Direito Público , fui vice-coordenador e
coordenador do curso de mestrado, chefe do departamento de Direito Processual,
representante da Faculdade junto ao CONSUN, assessor especial da Reitoria, além
de ser eleito para duas diretorias da Associação de Docentes da UFC (ADUFC),
exercendo os cargos de secretário-geral e secretário de assuntos culturais. No
período fui ainda Coordenador do Escritório Regional da UNESCO no Ceará, tendo
sido convidado para ser pesquisador-visitante na Faculdade de Direito da
Universidade de Harvard, convite que declinei para atender um outro, concomitante,
para ser professor-visitante no departamento de Teoria e Sociologia do Direito
da Universidade de Graz, Áustria. Dentre minhas diversas publicações, tanto
individuais, como em obras coletivas ou revistas especializadas, eu destacaria,
como representativas do conjunto, o livro “Teoria da Ciência Jurídica” (2ª.
ed.. São Paulo: Saraiva, 2009).
Já no período em que me transferi para a UNIRIO, candidatei-me a
Decano do CCH, quando a nossa ECJ estava vinculada a esse Centro, a fim de
demonstrar a necessidade de nossa Escola ser realocada, com mais propriedade,
em outro espaço universitário, o que de fato veio a ocorrer, com a criação do
CCJP, onde atualmente leciono disciplinas de Introdução ao Direito para os
cursos de Administração Pública e Ciência Política, além de minhas tradicionais
disciplinas no curso de Direito, isto é, História e Filosofia do Direito, contando
para tanto, como é normal, em se tratando de um Professor Titular, com o
auxílio de colaboradores do mais alto gabarito, graças a quem posso continuar
representando nossa Escola em espaços acadêmicos os mais diversos, no Pais e no
exterior, sem que haja prejuízo didático aos estudantes. No semestre em curso,
estou a ministrar, em parceira com o Prof. Dr. Thiago Bottino, a disciplina
“Direitos Fundamentais: Teoria e Efetividade”, no curso de mestrado em Direito
e Políticas Públicas.
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